Vida nocturna
Gostava de conseguir traduzir em palavras os sons que enchem a noite ao pé de um lago.
O gato que, solitário, vagueia ao longo da ponte deserta, demorando todo o tempo do mundo.
Ora parando aqui. Ora parando um pouco mais além. Apenas e só, porque não há hora, nem cama marcada.
Somente ele, e o instinto.
Escuta-se o coaxar das rãs que saltitam na água, perturbado de quando em vez pelo ruído de um carro tardio,
deixando um rasto luminoso no leito do lago deserto.
Aos poucos sente-se a humidade que trespassa a roupa leve de Primavera e se vai transformando em arrepios,
gelando-nos a pele. Porém, a vontade de permanecer, de demorar mais um pouco, observar, escutar e sorver a
magia da noite é inebriante. Mesmo quando já quase não sentimos os dedos das mãos e dos pés, enregelados.
A hora corre apressada e o caminho de regresso é longo.
Volta-se a cabeça com relutância para a despedida. Grava-se na memória e regressa-se em silêncio, como que
se não tivessemos o direito de perturbar este pequeno paraíso.
Basta ficar atento. Basta escutar. Basta tão pouco…